Cesar Victora: Contribuições da epidemiologia para as políticas globais de saúde
- Por ONutricional
- 3 de dez. de 2017
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"Ao longo de sua conferência na décima edição do Congresso Brasileiro de Epidemiologia, em outubro, Cesar Victora contou a trajetória do seu grupo de pesquisa desde 1982 em Pelotas, como professor da universidade federal recém-criada ali – a Universidade Federal de Pelotas: – “Junto com o pediatra e amigo Fernando Barros, criamos no país uma das primeiras coortes de nascimento, nome dado aos estudos que acompanham por longos períodos a saúde das pessoas nascidas em um lugar num certo ano. Temos mostrado que é possível mudar a amamentação e nós mostramos como, o Brasil mostrou que é possível. O grande mérito dessa mudança é o esforço de toda a sociedade junto com a Saúde Coletiva na remoção das barreiras contra a amamentação”, explicou.
As reconhecidas pesquisas sobre nutrição materno-infantil, iniciadas nos anos 1980, comprovaram hoje que o aleitamento exclusivo, sem água ou chás, reduz em 14 vezes o risco de morte infantil por diarreia e em 3,6 vezes por doenças respiratórias. O Brasil é atualmente a maior referência na valorização do leite materno. Após adotar a recomendação, o índice de mortalidade infantil reduziu em pelo menos 45%; a prática tem prevenido a morte de 800 mil crianças anualmente em todo o planeta. O aleitamento exclusivo é atualmente recomendado por organismos internacionais de saúde e voltados para a infância, como a Organização Mundial da Saúde e Fundo das Nações Unidas para a Infância.
Mil dias: O segundo ponto da conferência abordou a importância dos mil dias: os 270 da gestação mais os 730 dos dois primeiros anos de vida, ou seja, mil dias. As pesquisas de Victora comprovam que os cuidados nos primeiros 1000 dias de vida previnem não só a mortalidade infantil, mas também várias doenças crônicas da vida adulta: – “A gestação e os primeiros dois anos são a base mais crítica que vão definir a saúde do ser humano. Porém hoje sabemos que depois destes dois anos temos que nos preocupar com o outro lado da moeda: a alta prevalência de obesidade infantil e é aí que temos que tomar medidas que o Brasil não tomou até hoje, falo do controle da propaganda voltada para crianças e de novas taxas para a indústria de ultraprocessados. Outros países já tiveram coragem de fazer, o México já teve coragem, mas no Brasil o lobby industrial no Congresso tem impedido este tipo de ação. Vamos taxar mais, a coca-cola tem que custar uma fortuna!” pediu Victora.
No fechamento de sua conferência, Victora pontuou suas preocupações: – “Nesta última fase da minha carreira, minha preocupação maior é simplificar. Quero simplificar e conseguir conversar com gestores, tentar trabalhar com eles todos estes dados epidemiológicos na prática do dia a dia. Atualmente nosso grande problema é o alto índice de nascimento pré-termo. Nós temos no Brasil uma das maiores taxas de nascimento pré-termo do mundo. E a questão não é simples, não é uma epidemia só. Nós temos pré-termo de pobre e pré-termo de rico, são duas epidemias ao mesmo tempo. A de pobre se deve à ausência de pré-natal adequado – embora nós tenhamos uma média de 8 consultas de pré-natal, a qualidade é ruim. O pré-termo de rico envolve outra batalha perdida, a epidemia da cesariana. O Brasil é o segundo país com mais cesarianas, nós só perdemos para a República Dominicana. Cesariana e pré-termo são as duas lutas que precisamos enfrentar e eu espero que esta juventude de epidemiologistas e sanitaristas que estão aqui, se deem conta de que é possível fazer pesquisa boa no Brasil e que estas pesquisas possam resultar em mudanças práticas”, resumiu Victora."
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