Os limites do novo modelo de financiamento da Atenção Primária em Saúde
- Vanessa Daufenback
- 19 de nov. de 2019
- 2 min de leitura

A pressão pelo modelo gerencial no SUS e o apelo à "eficiência", que já existem, não trazem efetividade e incentivam apenas a produção de números de atendimentos e procedimentos, e foi usada como mote para um maior subfinanciamento da APS (Atenção Primária em Saúde), colocando fim à universalidade da cobertura ao vincular o recebimento de recursos à população cadastrada, sendo que o peso seria maior a grupos com vulnerabilidades demográficas e econômicas.
O “Novo Modelo de Financiamento da Atenção Básica”, apresentado pelo Ministério da Saúde no fim do mês de outubro, pode descaracterizar o modelo de assistência da Estratégia de Saúde da Família (ESF), que atua para a efetivação da horizontalidade e mudanças consistentes no perfil epidemiológico de comunidades a longo prazo, por meio de visitas domiciliares, vigilância em saúde e planejamento territorial, ações permitidas pelo financiamento de caráter universal.
Este mesmo tipo de financiamento garante a manutenção do NASF (Núcleos de Apoio à Saúde da Família), formados por outros profissionais de saúde (nutricionistas, psicólogos, terapeutas ocupacionais, educadores físicos, farmacêuticos, etc...e que nem são citados) apoiam ESF e garantem maior qualificação e suporte da assistência, e que portanto podem estar como os dias contados. O NASF nem chega a ser CITADO neste novo modelo de financiamento, que propõe a valorização de médicos, enfermeiros e cirurgiões dentistas por meio de residências, deixando outros profissionais da saúde de lado.
Além disso, essa medida gerará impacto negativo em regionais de saúde com menor capacidade instalada e de acesso mais difícil, concentrando a procura em grandes centros (aos moldes do antigo Inamps), gerando ainda mais desigualdades regionais e aumentando ainda mais a pressão sobre a gestão municipal. Apesar de dizer que será dada maior atenção, não fica claro o modo como serão recompensados.
Por último, este novo modelo, apesar de ter sido apresentado em Comissão Intergestores Tripartite (CIT), foi imposto verticalmente à sociedade civil sem discussão e participação social democrática, desconsiderando a participação do Conselho Nacional de Saúde. Seus números e proposições, apresentados por um documento de Powerpoint sem referências, não apresenta um diagnóstico concreto da atualidade, por isso não se tem exatamente uma análise profunda das barreiras e inconsistências do modelo atual, e porque um novo modelo de financiamento seria justificável. Além disso, este Powerpoint não traz análises de impacto por meio de dados confiáveis, ou mesmo experiências de êxito que justifiquem a mudança, levantando suspeitas sobre os reais objetivos desta proposição.
Em suma, o peso será jogado nas gestões municipais, que já possuem capacidade de financiamento local limitada, e que por isso vão pressionar ainda mais as equipes de ESF, que por sua vez podem ver seu trabalho sendo reduzido a números, às custas de um trabalho ainda mais exaustivo e ineficiente em sua capacidade de curar as pessoas.
Leia também: "Atenção primária à saúde terá novo modelo de financiamento"
Comments