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Importância das emoções na aprendizagem: uma abordagem neuropsicopedagógica. Parte 2

  • Alexandre Rodrigues Lobo
  • 13 de abr. de 2017
  • 5 min de leitura

Por que as emoções contam para a aprendizagem?

Por Vitor da Fonseca

Professor Catedrático e Agregado da Universidade de Lisboa, Consultor Psicopedagógico, Oeiras, Portugal

Artigo reproduzido da Revista de Psicopedagogia, 33 (102), 2016 (On line)

A emoção dirige, conduz e guia a cognição, não se pode compreender a aprendizagem sem reconhecer o papel dela em tão importante função adaptativa humana. A interdependência da emoção e da cognição no cérebro é demonstrada pelas novas tecnologias de imagiologia do nosso órgão de aprendizagem e de interação social (1,2). Ao longo da evolução humana e ao longo da educação da criança, ambas co-evoluíram e co-evoluem, elas são neurofuncionalmente inseparáveis.

Pela relevância que ela desempenha numa aprendizagem bem sucedida e com sucesso, a emoção é crítica para a aprendizagem logo para o aluno (ser imaturo, inexperiente, aprendente ou discente), mas também para o ensino, logo para o professor (ser maturo, experiente ou docente). Para se poder aprofundar a importância das emoções na aprendizagem, temos que necessariamente equacionar a sua importância no ensino, algo único da espécie humana, uma vez que ensinar é uma das suas especificidades mais singulares (3-6) e que envolve processamento de emoções em dois sujeitos em interação intencional e transcendente (7,8).

Em termos humanos, a aprendizagem é inseparável do ensino, não há docência sem discência (9), visto tratar-se de um processo de transmissão cultural intergeracional (10), que subentende uma dinâmica interpessoal profunda (mencionado anteriormente), logo de um processo social e intersubjetivo, pois envolve, simultaneamente, as emoções de um ser inexperiente com as de um ser inexperiente. Cabe assim ao professor a criação, a gestão, o planejamento e gestão do envolvimento social da sala de aula (ou do ecossistema pedagógico) para que se criem condições emocionais e afetivas ótimas para que a aprendizagem, como ato cognitivo construído e co-construído, aconteça efetivamente.

É impossível pensar em separar a emoção da aprendizagem ou a emoção da cognição ou da razão, ou conceber, exclusivamente e friamente, na individualidade do aluno ou no sujeito aprendente, pois temos que pensar também na individualidade do professor ou do sujeito docente, porque alunos e professores interagem socialmente e aprendem uns com os outros (9). Logo, quer a emoção, quer a cognição, devem ser enquadradas num contexto social e obviamente cultural.

A aprendizagem não é um ato isolado nem neutro afetivamente: só pode ser concebida num contexto de transmissão intencional e de atenção e interação emocional compartilhada, o que só por si integra emoções e cognições, leitura de faces e de mentes, exibição de sinais não verbais e corporais de tristeza, alegria, desgosto, surpresa, zanga, medo, etc (11-13).

"A aprendizagem só pode ser concebida num contexto de transmissão intencional e de atenção e interação emocional compartilhada"

(Imagem reproduzida de: "Concepções de professores de IES sobre o desempenho comunicacional...". Rev. CEFAC. 2013 Jan-Fev; 15(1):25-39.

As emoções não podem continuar a ser separadas das cognições nas escolas e nas salas de aula do século XXI, como o foram no passado. A aprendizagem significativa e motivadora é o resultado da interação entre a emoção e a cognição, ambas estão tão conectadas a um nível neurofuncional tão básico, que se uma não funcionar a outra é afetada consideravelmente.

As emoções afetam todas as aprendizagens, quanto mais envolvidas forem com elas, mais mobilizadas são as funções cognitivas da atenção, da percepção e da memória, e mais bem geridas e fortes serão as funções executivas de planificação, priorização, monitorização e verificação das respostas (14).

Quando o input emocional é adicionado à experiência de aprendizagem, o cérebro capta e processa os estímulos de forma mais significativa e profunda, facilitando a sua retenção e recuperação e, consequentemente, a elaboração e regulação das respostas. A emoção guia a atenção e esta, por sua vez, guia a memória e a aprendizagem (15-18).

As práticas educacionais que ocorrem numa instituição como a escola ou numa sala de aula não são neutras, não se concebem sem estar embebidas, encaixadas e incorporadas socialmente e emocionalmente (19). As neurociências nos ensinam que as emoções desempenham um papel formativo na cognição e na aprendizagem. É consensual que o funcionamento do cérebro na aprendizagem coloca a emoção incrustada na cognição; só em pacientes cerebrais as duas funções podem ser separadas (célebre caso de Phineas Gage e outros casos com alexitimia estudados por Damásio) (20-22).

Sem uma adequada regulação emocional nenhuma competência cognitiva superior ou racional, como aprender a tocar violino ou aprender a ler e a escrever, pode ser construída e produzida em termos comportamentais com fluência e expressividade. Os ensinamentos das neurociências, ao aproximar as emoções do processo ensino-aprendizagem, nos dão inúmeras ajudas para pôr em prática estratégias e experiências de interação emocionalmente significativas que melhoram, não só o ensino, como a aprendizagem nas escolas.

Parece óbvio que as emoções não só facilitam a construção e a co-construção de comportamentos adaptados presentes e futuros (papel da interação experiente-inexperiente em Fonseca [14]), como certamente são facilitadoras do desenvolvimento do processo de aquisição de novas informações e de novos conhecimentos, pois ao contrário do que habitualmente se pensa, as emoções não são apenas funções auxiliares ou secundárias da aprendizagem, são parte integrante do seu processo total.

Continua...

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Damásio A. The feeling of what happens: body and emotion in the making of consciousness. New York: Harcourte Brace & Co; 1999.

2. Immordino-Yang MH, Damásio A. We feel, therefore we learn: the relevance of affective and social neuroscience. Mind, Brain and Education. 2007;1(1):3-10.

3. Sousa DA. How science met pedagogy. In: Sousa DA, ed. Mind, brain & education. Bloomington: Solution Tree Press; 2007.

4. Sperry R. How a developing brain gets itself properly wired for adaptative function. In: Tobach E, et al., eds. The biopsychology of development. New York: New York Academic Press; 1971.

5. Varela F, Thompson E, Rosch E. The embodied mind: cognitive science and human experience. Cambridge: MIT Press; 1991.

6. Varela F, Maturana H. The tree of knowledge: the biological roots of human understanding. Boston: Shambhala; 1998.

7. Vygotsky LS. Problems of General Psychology. New York: Plenum; 1986.

8. Bodrova E, Leong D. Tools of mind: a vygotskian approach to early childhood education. New Jersey: Pearson; 2007.

9. Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra; 2005.

10. Tomasello M. The cultural origins of human cognition. Cambridge: Harvard Universty Press; 1999.

11. Fonseca V. Neuropsicologia: cérebro, corpo e motricidade. Rev Psique: Ciência Vida. 2016; 123(dossier: Enigmático Cérebro): 37-53.

12. Fonseca V. Dificuldades de aprendizagem não verbais. Rev Inclusão. 2000;1:89-112.

13. Rourke B. Nonverbal learning disabilities: the syndrome and the model. New York: Guilford; 1989.

14. Fonseca V. Aprender a aprender. 3ª ed. Lisboa: Âncora; 2014.

15. Goleman D. Working with emotional intelligence. New York: Bantam Books; 1998.

16. Goleman D. Emotional intelligence: why it can matter more than IQ. New York: Bantam Books; 2005.

17. Goleman D. Social intelligence. London: Hutchinson; 2006.

18. LeDoux J. O cérebro social. Rio de Janeiro: Objectiva; 1998.

19. Sousa DA. How science met pedagogy. In: Sousa DA, ed. Mind, brain & education. Bloomington: Solution Tree Press; 2007.

20. Damásio A. O erro de Déscartes: emoção, razão e cérebro humano. Lisboa: Europa-América; 1995.

21. Damásio A. The feeling of what happens: body and emotion in the making of consciousness. New York: Harcourte Brace & Co; 1999.

22. Damásio A. Looking for Spinoza: joy, sorrow and the feeling brain. London: William Heinemann; 2003.

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