Sem a batalha cultural, não haverá mudança possível para a esquerda
- ONutricional
- 18 de jul. de 2018
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"Não importa se o tempo, depois, faça com que parte da sociedade descubra as falsidades que foram difundidas, a mentira já terá alcançado o efeito desejado, deixando uma marca na consciência das massas"
Por Sergio Alejandro Gómez, Deny Extremera e Irene Pérez, para o Cuba Debate, via Carta Maior:
A cultura como terreno no qual se disputa uma batalha crucial entre a liberação e a alienação das mentes em nível global foi um dos mais importantes debates do segundo dia do 24º Encontro do Foro de São Paulo, que se realiza em Havana. O cientista político cubano Enrique Ubieta foi um dos que abordou o tema, e disse que o imperialismo aproveita sua hegemonia midiática para mentir com impunidade e impor o seu relato: “não importa se o tempo, depois, faz com que parte da sociedade descubra as falsidades que foram difundidas, a mentira já terá alcançado o efeito desejado, deixando uma marca na consciência das massas. Esta não é uma guerra estritamente de pensamentos, não é só uma batalha pela verdade, e sim uma disputa pela tomada de poder e sua conservação”, agregou. Entretanto, a guerra dos revolucionários deve sim ser uma guerra de pensamentos. “Porém, deve demonstrar aos potenciais leitores/espectadores/ouvintes que as mensagens que recebem são armadilhas que explodirão em suas mãos. Esta é uma zona de guerra que os revolucionários não perceberam a tempo, nem no século passado, nem no presente. É a batalha cultural, que é provavelmente a mais difícil, e também é decisiva para o futuro da esquerda”, analisa Ubieta, que logo completa: “não existe uma sociedade nova sem uma cultura nova”. O cientista político cubano acredita que há um certo cinismo em falar de um “fim do ciclo das esquerdas na América Latina”, já que os fatos demonstram outra coisa. “A ofensiva imperialista não se apoia numa reconquista do eleitorado, e sim em manobras para tomar o poder, golpes de Estado judiciais, perseguição jurídica de líderes políticos e sociais”, comentou. O venezuelano Gustavo Borges, do grupo Missão Verdade, mostrou sua preocupação pelo fato de que muitos intelectuais de esquerda no nível internacional têm sido convencidos pela propaganda ocidental, e que os mesmos desconhecem a realidade dos governos progressistas. “Nicolás Maduro é um dos presidentes mais caluniados do mundo”, afirmou. “Algumas pessoas de esquerda, tanto na América Latina quanto na Europa, foram consumidas pelo discurso de que na Venezuela não há uma democracia”, acrescentou. Borges explicou como seu país enfrenta uma guerra não convencional sem precedentes, similar às revoluções coloridas na Europa Oriental e à Primavera Árabe no Oriente Médio e Norte da África, e que a Venezuela é um dos poucos países do mundo que tem conseguido resistir, graças ao apoio popular. Por sua parte, o cineasta e político argentino Tristan Bauer destacou a importância de tratar a cultura como parte do planejamento estratégico de quem aposta por realizar mudanças sociais sólidas em seus países. “Entendemos os modelos neoliberais como modelos econômicos, mas são muito mais que isso. Sem dúvidas, o neoliberalismo é também um modelo cultural que cria subjetividades colonizadas”, explicou o autor de “Iluminados Pelo Fogo” (2005) que criticou a tentativa de se colocar um rótulo negativo nas mudanças realizadas na América Latina nos últimos anos, e mostrá-los como experiências frustradas. “Para mim, estes anos foram extraordinários, e temos que reivindicá-los, aprender dessas experiências, de forma a ter também uma visão crítica, mas sabendo que avançamos nesta etapa como poucas vezes pudemos fazer em nossa história”, disse. Nesse sentido, Bauer recordou as palavras da ex-presidenta argentina Cristina Fernández numa entrevista recente com seu contemporâneo equatoriano Rafael Correa, para o canal RT, onde disse que a cultura é uma ferramenta central, e que se não somos capazes (como esquerda) de gerar mudanças nesse sentido, nada mais podemos fazer. “Sou daqueles que pensa que este poder gigantesco (dos grandes grupos financeiros) pode ser derrotado, estudando seus erros e buscando como vencê-los pouco a pouco, e avançando”, concluiu. O analista político cubano Ernesto Limia defendeu uma articulação entre arte, pensamento e história para construir cultura política e cimentar as bases de uma nova hegemonia cultural. “Nesta era da pós-verdade, ou da muita-mentira, o melhor que podemos fazer é tocar os homens e mulheres com nossas ideias. Os intelectuais têm que ser mais didáticos, ajudar os povos a pensar”. A palestra sobre Arte e Cultura, durante o 24º Encontro do Foro de São Paulo deve propor uma série de ações para enfrentar os desafios dos movimentos progressistas na região, entre os quais já transcenderam a criação de um sítio web para difundir as melhores ideias do pensamento de esquerda e continuar fortalecendo a Rede de Intelectuais em Defesa da Humanidade.
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