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Robert Selman: estratégias para incorporação de habilidades socioemocionais na prática educativa

  • Por ONutricional
  • 10 de dez. de 2017
  • 4 min de leitura

Reproduzida da Nova Escola. Por Wellington Soares

Robert Selman, professor de Harvard, se dedica a pesquisar o desenvolvimento de habilidades de convivência na escola, mais especificamente nos primeiros anos da Educação Básica. Na entrevista concedida para a Nova Escola, ele discute possíveis estratégias para incorpora-las à rotina.

Por que as habilidades socioemocionais têm ganhado tanto espaço? Robert Selman: Há algumas décadas, acreditava-se que o ensino de competências relacionadas à convivência cabia exclusivamente às famílias e que as escolas deveriam se debruçar apenas sobre o conhecimento acadêmico. Com o tempo, passou-se a acreditar que a escola deveria também formar cidadãos, mas sem clareza sobre o que era necessário para isso. Por essa razão, ainda havia resistência à incorporação de competências como amabilidade, estabilidade emocional e consciência. Quando, nas décadas de 1980 e 1990, epidemias de violência e conflitos se espalharam pela sociedade, o cenário começou a mudar, pois esses problemas também atingiam as escolas. Como é comum acontecer, acabou cabendo à Educação lidar com esses problemas que o mundo não conseguia. Nesse contexto, o papel que era das famílias passou a ser considerado também um papel das instituições escolares. Começaram a surgir, então, diversas propostas para trabalhar com essas questões. Recentemente, o movimento da aprendizagem socioemocional saiu em vantagem porque algumas pesquisas mostram que, quando colocamos essas habilidades no currículo, o desempenho acadêmico também melhora. Esse movimento nomeia habilidades como cooperação, extroversão e abertura a novas experiências para fazer com que as instituições de ensino trabalhem especificamente com elas. Mas a questão é: o quanto dessas responsabilidades podem ser colocadas na conta do professor?

Qual deve ser o currículo para trabalhar as habilidades?

Robert Selman: As evidências mostram que o trabalho com elas deve ser modesto e bem definido. Isso quer dizer que devemos integrá-las ao currículo de maneira que não seja onerosa aos docentes. O professor define o conteúdo acadêmico e, junto a ele, os conteúdos sociais que ache importantes (como conviver com diferentes ou fazer revezamentos em uma brincadeira) e, a partir daí, concebe seu planejamento. O que eu faço em minhas formações é tentar chamar a atenção para essa questão, para que os professores tentem incorporar os temas relacionados às habilidades sociais ao planejamento do dia a dia. Outra dimensão do trabalho pode estar na criação de novas funções dentro da escola. Algumas instituições americanas já começam a ter o papel do “coordenador de clima”, um educador que trabalha junto ao gestor para incorporar as questões sobre convivência no cotidiano da escola.

Quais materiais o professor pode usar para realizar esse trabalho?

Robert Selman: Com crianças pequenas, acredito que a literatura é um recurso importante. Nas práticas de leitura que já fazem parte do planejamento da pré-escola, é possível utilizar obras que tratem de questões de sociabilidade presentes no cotidiano da escola. Fizemos uma pesquisa em escolas urbanas dos Estados Unidos e notamos algumas dessas questões: as diferenças entre meninos e meninas, conflitos sobre a vida na periferia, questões raciais e assim por diante. Pensamos, então, em sugerir livros em que esses temas aparecessem de alguma maneira.

Especialistas em leitura não recomendam que o trabalho com livros se paute na busca por uma moral da história. Como usar a literatura sem cometer esse equívoco?

Robert Selman: Ler livremente sem nenhum direcionamento não fará mal a nenhuma criança, mas talvez também não faça tão bem quanto poderia. O professor precisa se preparar: ler o livro e escolher aquele que trata de algo sobre a convivência que ele queira discutir com as crianças. Isso também envolve ter um planejamento e um objetivo específico para a atividade. Com isso pensado, a leitura e a discussão podem ser encaminhadas não de maneira restritiva, dizendo aos alunos “Isso o que você achou está certo” ou “Isso que você achou está errado”, mas dando ênfase a aspectos como a relação do personagem com os outros, os conflitos que ele vive ou as dificuldades que enfrenta. Nesse caso, o professor não pode deixar que a atividade se encerre sem que esses pontos tenham sido discutidos.

Em quais outras situações essa discussão pode acontecer?

Robert Selman: O próprio cotidiano escolar é um campo fértil. Há conflitos sociais nas salas de aula o tempo todo. E, na primeira infância, uma das coisas mais eficazes que os professores podem fazer é simplesmente não questionar esses conflitos, mas ajudar as crianças a desenvolver maneiras de resolvê-los. Muitos pequenos já possuem conhecimentos complexos sobre como lidar com essas situações, porque vivem em comunidades em que precisam exercer habilidades sociais complexas. Uma possibilidade de intervenção simples é o professor pedir que, no momento de resolução de conflito, os pequenos tentem deixar de lado as reações naturais – como chorar ou revidar uma agressão – e se esforcem para comunicar, com as palavras, o que estão sentindo. Não é fácil fazer isso, especialmente quando você está triste ou com raiva, mas pode-se começar a construir como um hábito. Uma compreensão profunda dos conflitos envolve usar as palavras exatas para entender o que acontece e devemos estimular isso nas crianças.

Existem situações de conflito impossíveis de serem resolvidas? Robert Selman: Não. Há alguns casos bastante específicos em que pode ser mais difícil compreender o que está acontecendo, principalmente quando a violência ou o isolamento parecem vir do nada. Por exemplo, crianças traumatizadas por situações que passaram na comunidade onde vivem. Às vezes, o incidente disparador parece tão modesto para outras pessoas, mas tem uma reação grave na criança. Nesses casos, a escola deve prestar atenção nessas pessoas e oferecer recursos para que elas se sintam em um lugar seguro.

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