O Segredo de Minerva
- Joralima
- 28 de jan. de 2017
- 3 min de leitura
Por Jorge Alves de Lima

A cidade de São Paulo completou, nesta semana, 463 anos de fundação. Já é, portanto, uma senhora de respeito. Não estive a par das comemorações, mas invariavelmente são as mesmas coisas todos os anos. Parece que, nesta vez, a novidade foi a volta do Bolo do Bixiga, que havia parado por falta de patrocínio. Feliz ou infelizmente, a população não o despedaçou em questão de minutos – pelo contrário, civilizadamente, cada qual recebeu um pedaço. No fundo, tanto quanto a tradição de sempre fazer um bolo maior do que no ano anterior, havia também a graça (ou o horror) de contabilizar, em centésimos de segundos, o tempo que o bolo seria devorado pela multidão.
Para quem não conhece, esse Bixiga é também a Bela Vista, antigo bairro de imigrantes italianos, colado à Liberdade – outrora também um reduto de estrangeiros (japoneses, em sua maioria). Hoje, esses bairros centrais têm ocupação bem mais popular – sendo, aqui e ali, pontilhados de moradias coletivas (cortiços, como a tal “Saudosa Maloca” cantada pelo querido Adoniran Barbosa).
É nessa São Paulo mais do que quatrocentona, mutante e tão cheia de detalhes que se passa “O Segredo de Minerva”, do estreante Fernando Cilio. E Sampa está tão intimamente ligada ao desenrolar deste romance policial-esotérico que já nas primeiras páginas troca a condição de cenário pela de personagem a ser decifrada, quase protagonista, das venturas e desventuras de Matheus e Maria Eduarda – dupla que preenche as mais de 300 páginas do livro.
Cilio foi generoso em partilhar com seus leitores o resultado de suas pesquisas em torno dos muitos símbolos maçônicos e religiosos espalhados pela cidade. Usando-os, tanto os ocultos quanto aqueles do tamanho de um prédio, o autor teceu uma delicada, intrigante e saborosa rede de implicações, em um jogo que conduz o leitor pelos muitos labirintos da metrópole. Por isso, é preciso fôlego e atenção para acompanhar a história, que, por vezes, adota ritmo de videoclipe, enquanto, outras vezes, é professoral e didática, ensinando-nos o que, em outra parte, não aprenderíamos sobre a história da igreja romana ou sobre a maçonaria – duas das instituições igualmente presentificadas no texto (a polícia paulista também ganhou destaque nesta história escrita por um advogado que já foi policial – e que entende de vinhos e de alta gastronomia como poucos).
Aliás, quem conhecer o autor pessoalmente, que mantém uma pequena e charmosa adega na agradável Águas de São Pedro, no interior paulista, pode adivinhar algumas notas biográficas no personagem Matheus – e talvez esboçar, aqui e ali, um pequeno sorriso maroto. Certamente valerá a pena pensar quem seria cada um dos outros personagens, se a vida imitasse a arte – e não o contrário. Mas não é preciso conhecer o autor para reconhecer-lhe o talento na construção desses personagens, no uso dos cenários e, principalmente, na formatação das muitas cenas de ação – dignas de filmes hollywoodianos.
Numa São Paulo carente de áreas verdes, o autor, simbolicamente, começou e terminou sua trama em dois importantes parques paulistanos. Por falar em terminar, lembro-me de, na primeira vez que li, não ter gostado nenhum pouquinho do final: achei-o fora de contexto. Na segunda vez, contudo, compreendi o desfecho e o entendi como uma ideia brilhante e, ao mesmo tempo, surpreendente – e que permite imaginar que há muito mais história para ser contada. Ainda bem.
Autor: Fernando Cilio
Título: O Segredo de Minerva
Editora: Clube de Autores
ISBN: 9990051870688
Páginas: 363
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