Reaprendendo a ler notícias
- Joralima
- 14 de nov. de 2016
- 5 min de leitura

Por Jorge Alves de Lima
A revista Veja e o jornal O Estado de São Paulo, também conhecido como Estadão, foram dois dos noticiosos que fizeram parte do final da minha infância e do começo da minha adolescência, graças a uma prima que trabalhava em um consultório ginecológico e os trazia para mim. Por obra divina, o médico não assinava a Contigo, uma revista de fofocas, e nem existia a famigerada Caras – publicações mais comumente encontradas nas salas de espera e que certamente teriam castigado minha formação enquanto leitor de notícias.
Depois, cheguei a ser leitor regular da Folha da Tarde e do Jornal da Tarde – conhecidos por terem um ar mais descontraído. Também assinei a revista IstoÉ, de notícias, além da Playboy – segundo amigos e inimigos, fui um dos poucos leitores das matérias escritas da revista, pois muitos se interessavam apenas pelos ensaios fotográficos. Há controvérsias. Verdade é que eu gostava de revistas, por isso, fui leitor regular de Exame, Casa Cláudia, Mundo Estranho, Superinteressante, Caros Amigos, Cult (dessa, tenho muita saudade), Bravo, Seleções, Projeto, Urbs, Época e Você S/A.
Apesar de ainda acompanhar com alguma regularidade diversos meios, confesso que, dentre os veículos escritos, acostumei-me de vez ao padrão da Folha, que procura atrelar comentaristas/colunistas aos assuntos, formando o binômio notícia e opinião, que, comigo, tem funcionado bem. No formato revista, porém, as publicações da Folha beiram à futilidade: a revista que circula aos domingos até melhorou bastante, mas aquela Serafina (mensal) é de doer…
Sem nunca ter sido assinante, lia frequentemente e gostava muito do finado Jornal do Brasil (e sua ótima revista dominical) e ainda leio, quando posso, O Globo. Porém, sendo revisor de texto, o tempo para ler periódicos foi ficando escasso, ao passo que ficou mais fácil seguir as notícias pelo rádio e, claro, pela internet. Ainda assim, atualmente, sou leitor-assinante da Folha. De uns tempos para cá, tenho ouvido muito sobre a questão de a mídia estar vendida para este ou para aquele lado; daí que resolvi experimentar: assinei, mesmo sem conhecer, a revista CartaCapital.
Ocorre que, por engano, junto com a terceira remessa – que acabou de chegar aqui em casa – veio também um exemplar da revista Veja, devidamente acompanhado da Veja em São Paulo (a Vejinha). Uns vinte anos atrás, isto seria o mesmo que acertar na loteria: ter duas revistas para ler no mesmo final de semana! Mas não desta vez: não me interessei nem mesmo em folhear a Veja, ao passo que esta terceira entrega da CartaCapital me alcançou sem que eu tivesse lido nenhum dos exemplares já recebidos. Em verdade, na semana passada, com a chegada do segundo exemplar, lembrei-me de tirar o primeiro da embalagem para, enfim, folheá-lo.
Com a revista em mãos, estranhei tudo: a diagramação, a distribuição das matérias, os anúncios e, claro, o foco. A sensação de estranheza reside, principalmente, na abordagem: parece-me que vou me deparar com informações desencontradas, pois, evidentemente, quando uma revista semanal fica pronta, muitos de seus assuntos já foram tratados e, por esse prisma, boa parte da construção da minha opinião sobre determinado tema já se deu a partir dos outros meios de comunicação.
Percebo-me, portanto, diante de um exercício de leitura, pelo qual eu preciso reaprender a ler o que é novo, o que é diferente. Não tive essa estranheza com a revista Caros Amigos, que, se me recordo bem, se apresentava também como fora do circuito tradicional. Claro que eram outros tempos: sendo jovem, a novidade me chegava sem muitas barreiras ao coração e dali se irradiava para o corpo e para o espírito. Aos 43 anos, vejo que fui ficando um pouquinho reacionário e ligeiramente refratário à novidade – além de reclamar da “juventude transviada” com os mesmos velhos argumentos que eu ouvira na minha mocidade.
Penso que essa troca de papéis entre jovens e nem tão jovens seja cíclica e sirva para alimentar o movimento do mundo: não fossem os jovens acreditarem nas revoluções, no futuro e nas utopias e talvez ainda estivéssemos morando em cavernas. Por outro lado, não fossem os mais experientes corrigindo os rumos, propiciando os meios e garantido os resultados, talvez também ainda estivéssemos no tempo das cavernas – mas já sem cavernas para morar.
Por enquanto, percebo que fiz com a CartaCapital aquilo que eu fizera com a Wikipédia, com o Firefox, com o ReclameAqui, com a própria Folha e com outras organizações: assinei ou investi (não muito, claro) para patrociná-los enquanto alternativa, pois penso ser positivo termos opções à disposição e sermos igualmente responsáveis por elas. Por não acreditar em notícia grátis, resisto o quanto posso ao conforto de buscar informações fáceis em páginas da internet supostamente gratuitas – e nem tenho mais idade para acreditar em total imparcialidade na produção de conteúdo: todos temos um ponto de vista para defender e o fazemos com maior ou menor parcialidade.
Daí que ler a revista CartaCapital venha a ser o meu exercício pessoal em busca de um novo olhar. Não sei muito sobre a revista, mas aposto que seja uma boa publicação, pois não chegou ontem ao mercado e tem em Mino Carta um publisher respeitável. A publicação tem muitos (e ferozes) críticos – aliás, foram as críticas que me contaram de sua existência. E parece-me que essas críticas também signifiquem que a revista não é um veículo invisível: sua mensagem chega aonde tem que chegar e deve incomodar alguns players do mercado e da política (sabe-se lá onde o “mercado” se distingue da “política” nesses tempos de conluios). Daí que ler a revista CartaCapital venha a ser o meu exercício pessoal em busca de um novo olhar. Não sei muito sobre a revista, mas aposto que seja uma boa publicação, pois não chegou ontem ao mercado e tem em Mino Carta um publisher respeitável. A publicação tem muitos (e ferozes) críticos – aliás, foram as críticas que me contaram de sua existência. E parece-me que essas críticas também signifiquem que a revista não é um veículo invisível: sua mensagem chega aonde tem que chegar e deve incomodar alguns players do mercado e da política (sabe-se lá onde o “mercado” se distingue da “política” nesses tempos de conluios).
Penso ser esse o papel de uma publicação no formato de revista: reunir um grupo de leitores em torno de um ponto de vista. Acreditar na sua maneira de narrar o mundo. Vender uma alternativa de pensamento. Aliás, porque creio nisso, critico respeitosamente a existência de revistas como a Caras, mas as folheio sem compromisso e com ligeira diversão enquanto espero meu dentista me chamar.
Da minha parte, contudo, espero reaprender a ler textos diferentes do que eu venho lendo, sem esse sentimento tão forte de estranheza – e, com esse reaprendizado, quem sabe, recobrar um pouco da juventude que está me escapando velozmente com o passar do tempo. E também ainda espero uma revolução, em mim e no mundo – mas, agora, já torço para que seja mansinha e respeitosa. Uma revolução, como diria Drummond, “Que faça acordar os homens e adormecer as crianças”.
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